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Marillion: A carreira da banda passada a limpo

  

Esse texto, sobre a banda de rock progressivo Marillion, talvez não seja direcionado para seus fãs. Devo dizer que ele será mais útil talvez para os que se surpreenderam com o novo disco, Sounds That Can’t Be Made (2012). Ou para os que pretendem ir nos shows que eles farão no Brasil em outubro (depois de mais de dez anos sem pousar aqui). Imagino que servirá também para os que só conhecem seus grandes hits, como ‘Kayleigh’ e ‘Lavender’. E decerto pode agradar a quem busca um guia de referências para a história da banda.
Mas esse texto foi concebido – e é dedicado – para quem acha que a banda deveria ter acabado depois de Clutching at Straws (1987). Esse tipo de fã costuma ser identificado depreciativamente como “viúva do Fish”, referência ao inesquecível vocalista.
Marillion com Fish, na década de 80.
A obra-prima: Misplaced Childhood
Pois bem, dedico esse texto para (o)as “viúvas do Fish”. Espero que não se ofendam com o termo: em minha defesa, digo que também tive minha fase “viúva” do carismático e beberrão cantor escocês. Lembro-me que o primeiro disco que ouvi do Marillion, ainda no século passado, foi justamente seu canto do cisne, “Clutching…”, e isso bastou para que eu os colocasse no olimpo das minhas grandes bandas. E em seguida coroei a decisão ao me deparar com o atemporal Misplaced Childhood (1985) – e só quem o ouviu com atenção e deleite sabe do que estou falando. É o disco de ‘Kayleigh’ (um hit perfeito, na minha humilde opinião); talvez o grande album conceitual dos anos 80; é definitivamente o trabalho que fez os holofotes se voltarem novamente para o progressivo, numa época em que o estilo era crucificado por dez entre dez críticos.
Clutching at Straws, último disco com  Fish
O que ‘Misplaced…’ representa não é pouco, mas isso também pôde ter prejudicado a banda. A grandiosidade do album lançou uma grandiosa sombra sobre sua carreira, que perdura até hoje. Seu legado é ainda o combustível das “viúvas”. Graças a ele, enxerguei a “fase Steve Hogarth” com desconfiança por algum tempo.
O primeiro disco que ouvi com os vocais de Hogarth foi Brave (1994), e não gostei. Engoli Holidays in Eden (1991) porque era acessível, aliando o caráter comercial com certo apuro sonoro. Com o tempo, fui aprendendo a apreciar esses dois trabalhos, e a criar boa vontade de atirar longe algumas das peças de roupas pretas que marcavam minha “viuvez”.
Lembro-me de ter comprado Anoraknophobia (2001) logo que foi lançado (eram tempos onde a banda ainda lançava discos em lojas de música, e tempos em que existiam lojas de música). Nessa época, tinha meu palpite para a contagem de pontos do embate “Fish/Hogarth”, e não acreditava em empate no placar: pra mim, Fish ainda liderava. Tudo bem que Seasons End (1989) tinha preciosidades do quilate de ‘Easter’; tudo bem que gostava de ‘Holidays…’, tudo bem que aprendi a enxergar o (enorme) valor de ‘Brave’, e muito lentamente descobri que Afraid of Sunlight (1995) vai muito além de ‘Beautiful’.
(um parênteses: me parece ser tão incrível ver uma banda de rock progressivo emplacar um hit em meados dos anos 80 – ‘Kayleigh’ – quanto ver a mesma banda repetir a façanha no olho do furacão grunge dos anos 90 – com ‘Beautiful’. Fica aqui um pequeno adendo sobre esse mérito)
Talvez meu julgamento sobre estivesse manchado pelos discos que o Marillion lançou entre 1997 e 1999. Até hoje tenho preguiça de This Strange Engine (1997) (apesar da maravilha que é ‘Estônia’), e acho que Radiation (1998) foi uma tentativa muito ruim de se inspirar em bandas como Radiohead. O resultado de marillion.com (1999) me pareceu talvez melhor, mas muito aquém do que a banda podia chegar. Vale lembrar que, nessa época, eles estiveram muito próximos de encerrar as atividades.
É aí que, em 2004, surge um “marco zero” na carreira da banda, o momento em que, a meu ver, a balança entre a contribuição do Marillion de ontem e de hoje se iguala. É o ano de Marbles (2004), que reinventa a carreira do quinteto. Nesse disco, estão os melhores elementos do seu lado pop, e também do lado progressivo. Faixas acessíveis, grandes suítes, letras inspiradas, boas performances de cada integrante. E tudo soa integrado, sem a sensação de ser uma colcha de retalhos. Ouvir esse disco com atenção é um irresistível convite a abandonar de vez a viuvez do passado, e perceber que o menino com bolinhas de gude nos olhos não deve nada para o palhaço Jester.
O que salvou o Marillion foi o crowdfunding, numa época em que o hábito estava longe de ser a moda que é atualmente. Sua base fiel de fãs, financiando as gravações antes mesmo dos discos serem lançados, possibilitou que se afastassem da opressão das gravadoras, com sua ânsia por hits grudentos e sucessos de vendagem. O elevado saldo artístico da banda no século XXI nos deixa uma pergunta no ar: em que medida as exigências das gravadoras EMI e Castle Records impediram que a fase “pós-Fish” mostrasse a que veio?
Depois de ‘Marbles’, percebe-se que o Marillion manteve o nível. Somewhere Else (2007) foi criticado pelos fãs xiitas, menos por sua qualidade, e sim porque ‘Marbles’ deixou todos mal acostumados. Os anos demonstraram que esse disco tem o sabor dos bons vinhos – sente-se seu valor pelo aroma de boca, pelo retrogosto que sucede o gole. E quando anunciaram que o disco seguinte seria duplo, novamente as espectativas foram gigantes, mas dessa vez as reações iniciais ao lançamento não foram tão passionais quanto em ‘Somewhere Else’:  Happiness is the Road (2008) pode ser tudo, menos um disco fraco. Por ser duplo, é compreensível que momentos menores pipoquem aqui e ali, mas o que dizer de um album com canções como ‘This Train is My Life’, ‘Trap the Spark’ e a faixa-título?
Less is More (2009) foi um trabalho de regravações de antigas e novas canções. Seu mérito é a coragem de arriscar, de sair da zona de conforto, experimentando timbres e arranjos bem diferentes do que a banda costuma se valer. Apesar da ousadia, parece ter havido um certo consenso sobre o trabalho ser mais “less” que “more” – ainda que no DVD Live from Cadogan Hall (2010) o elemento visual mostre como a proposta tem algo de interessante.
Chegando em 2012, temos então o lançamento de Sounds That Can Be Made. O disco vazou na internet, e eis que escrevo agora sobre ele enquanto o ouço pelas primeiras vezes. O entusiasmo com que o sinto é o mesmo de tantas pessoas que, pelo twitter e facebook, tem comentado empolgadas sobre o disco. Difícil falar de algo no calor do momento, mas ao que me parece, é o melhor disco da banda desde Marbles. Mas preciso ouvir melhor para falar mais a fundo.
Enfim, fica aqui a intenção de apresentar (ainda que sucintamente) alguns bons motivos para se abandonar a viuvez do Marillion com Fish – e, parafraseando um grande disco da “era Hogarth”, não se ter medo da luz do sol.

Texto – Esquinas Progressivas

Na coluna que mantenho no site Progshine, publiquei essa semana um ensaio sobre o rock progressivo e o Clube da Esquina. É a primeira parte de duas (a segunda estará no ar no próximo domingo).
No texto, eu identifico alguns momentos da carreira dos principais nomes do Clube (Milton Nascimento, Beto Guedes, Flávio Venturini, etc.) onde eles se utilizaram de elementos do rock, mais especificamente na sua vertente progressiva
Confiram lá (e comentem, lá ou aqui!)

Resenha – Clockwork Angels (Rush – 2012)

Tarefa intrincada a de escrever algo no calor dos acontecimentos. Por um lado, não se tem o distanciamento necessário para analisar friamente seu alvo. Porém, a paixão que motiva a escrita fornece rico combustível em si mesma – lenha e calor dentro da mesma locomotiva, um trem fascinado com os próprios vapores.
Ao longo de 2011 e início de 2012, fãs e admiradores da banda canadense Rush se encontravam acometidos de uma imensa espectativa – desde que foi divulgado que o trio estava prestes a lançar um disco de inéditas, e dessa vez conceitual (todas as canções girando em torno de um mesmo tema). O lançamento gradual de algumas músicas avulsas apimentou a coisa, até que Clockwork Angels finalmente saiu do status de lenda para enfim se tornar uma realidade conhecida (esta, pelo que acompanhei dos comentários da maioria dos fãs da banda, muito bem vinda).
E, se por um lado as opiniões são quase unânimes em apontar o disco como um dos melhores deles em muito tempo, me pego pensando que pelo menos um outro aspecto importante para a apreciação desse trabalho deve ser discutido. Diz respeito ao fato de ser uma banda com um currículo de mais de quatro décadas, e isso deve ser considerado em relação ao que esperar da produção desses três brilhantes senhores.
Particularmente, vejo que Clockwork Angels é especial justamente por não por representar um trabalho “inovador” – ou seja, por não mostrar um Rush que quer novamente rodar os dados para encontrar novas combinações, nem tirar novos coelhos da cartola. É uma banda que, reconhecendo-se madura, busca agora sua própria essência. Ao olhar para o próprio umbigo (espaço do corpo onde muitos só enxergam auto-indulgência e pretensão), são capazes de identificar as pérolas e as vísceras do que melhor fizeram em tanto tempo (fato evidenciado na estética e nos temas da turnê mais recente da banda, Time Machine).
Assim, chegaram a um trabalho que soa mais Rush do que nunca. É uma banda que vasculhou o próprio baú, correndo o risco de montar um frankstein de si mesma, mas que felizmente realizou o feito de se mostrar crítica e relevante o suficiente para oferecer seu melhor. A própria iniciativa de um disco conceitual, ambientado em um universo de ficção científica (ou, nesse caso específico, do steampunk), nos remete imediatamente a 2112, primeiro clássico dos caras.
Mas nem tudo é nostalgia ou é referencial. Em CA, a novidade que mais chama a atenção, a princípio, parece ser a inclusão de arranjos de cordas. É um fato aparentemente inédito na carreira da banda (ok, Losing It, de 1982, contava com uma participação de violino, mas nada igual ao resultado de agora), e que, diferentemente de tantos projetos que unem rock pesado e arranjos orquestrais (moda que há cerca de uma década rendeu trabalhos de “medalhões” como Metallica ou Scorpions), não caiu no pastiche. Atuando de forma discreta, o naipe de cordas não prejudica o destaque que oportunamente recai sobre Geddy, Alex e Neil.
Discutidos os grandes designs gerais, é hora de nos voltarmos para as “pequenas vitórias” que são cada uma das faixas de Clockwork Angels. O trabalho começa com as duas canções que haviam sido divulgadas pela banda há mais de um ano: Caravan e BU2B mostram que essa jornada do Rush pela sua cronologia segue em linha inversa, partindo do presente para voltar ao passado. As primeiras faixas divulgadas soam bem afinadas com o material recente, como Snakes & Arrows e até mesmo o EP Feedback. Já a faixa-título carrega algo quase que transcendental, e parece ser a que mais representa (pra mim, pelo menos) a dificuldade em escrever sobre um trabalho ainda tão “fresco”. Nessa faixa, acho que a banda aponta para algum lugar novo e surpreendente.
Dali em diante, é possível encontrar ecos de duas fases específicas da história do Rush: de um lado, os discos dos anos 90, e de outro lado, os discos situados entre Hemispheres (1978) e Moving Pictures (1981). The Anarchist tem diversos momentos que evocam a dinâmica de clássicos como Red Barchetta e traços da sonoridade do início dos 80. Já Carnies é bem sessentista, com a introdução talvez mais pesada do disco, e que contrasta com pontes e trechos bem diversos entre si. Na sequência, Halo Effect apresenta algo da ambientação de Test for Echo (1996), com seus violões a la Resist. E Seven Cities of Gold inicialmente parece retornar aos primeiros discos, graças a seu riff setentista e sua crueza sonora; mas as sofisticadas mudanças de andamento trazem trechos que novamente retomam muito do que a banda fez nos anos 90.
BU2B2é uma vinheta que serve mais como uma espécie de “liga” para o contexto do disco (e, para o ouvinte desavisado, vale como lembrete do caráter conceitual da peça como um todo). The Wreckers é uma espécie de balada folk (temperada, porém, com a sonoridade da banda), cuja dinâmica sem excessos resulta em bons resultados. Headlong Flight é direta na melodia e nos arranjos (apesar de apresentar variações dinâmicas do mais puro virtuosismo e competência). Wish Them Well parece ter saído diretamente das sessões de Counterparts (1993), e não faria feio caso figurasse no repertório do Rush dos anos 90. Por fim, The Garden encerra grandiosamente o disco – repetindo o que afirmei sobre a faixa-título, ouço nessa faixa algo que parece apontar mais para o futuro, ou pelo menos para além de referências já manjadas dentro do legado do Rush.
Para não me alongar mais, me confesso positivamente surpreso com Clockwork Angels: um disco coeso, em que se torna quase impossível detectar deslizes e momentos menos expressivos. Funciona tanto como peça única quanto em suas faixas individuais. E o que dizer da beleza das letras? Temos aí um Neil Peart tão inspirado liricamente quanto em suas percussões explosivas, e tais versos mereceriam uma resenha a parte. A parceria entre o Rush e o produtor Nick Raskulinecz (que já dura há cerca de uma década) finalmente rendeu frutos de altíssimo nível.
Em vez de “dar trabalho pros anjos” (referência a canção Workin’ Them Angels) e deitar e rolar na comodidade, o Rush preferiu mesmo foi trabalhar diretamente com seus anjos, e o resultado acabou sendo primoroso. Se não sair nada melhor em 2012 (o que acho difícil), esse escriba opina que Clockwork Angels é definitivamente o disco do ano. 

Os Baby Beatles – Parte 1



Difícil encontrar alguém que nunca ouviu falar de John, Paul, George e Ringo. Só os primeiros nomes já são suficientes para adivinhar o resto. Mas se falarmos de nomes como Julian Lennon, Sean Ono Lennon, James McCartney, Stella McCartney, Dhani Harrison, ou Zak Starkey… faz idéia de quem sejam?


Neste texto, dou uma geral sobre os filhos dos Beatles, que carinhosamente (ou ironicamente) chamo de Baby Beatles. Todos se aproveitam dos famosos sobrenomes, algo quase inevitável. Os famosos rebentos não poderiam passar ilesos nem se quisessem.


Mas não digo isso pejorativamente. Alguns deles herdaram mais que a alcunha nas certidões de nascimento: herdaram um notável e impressionante talento de seus pais.


A parte 1 trata dos filhos de Lennon, que são as crias com maior destaque no universo pop. Na parte 2, comentarei a vida e obra dos outros filhotes de Paul, George e Ringo.


Parte 1 – Baby Lennon’s


Julian Lennon




Na minha opinião é o mais talentoso, e certamente o mais injustiçado baby. Afinal, foi ele que puxou o carro da ilustre prole beatlemaníaca. Julian é filho de John e Cynthia Powell, a primeira esposa do falecido beatle.



Vocês se lembram da canção Hey Jude? Originalmente ela se chamava “Hey Jules”, e foi composta por Paul McCartney para o filho de Lennon, na época parceiro nos Beatles.



Se o primeiro filho de John herdou o carma atribulado do pai (lar despedaçado, pai ausente, pecha de artista atormentado), pode-se dizer que a capacidade de compor belas músicas também veio de brinde. Seu primeiro disco, Vallote (1984), é um clássico instantâneo, que revelava um promissor intérprete e compositor (ouça aqui a belíssima faixa-título do disco).



Infelizmente, o rapaz talvez não soubesse em que mato estava se metendo quando deu o start em sua carreira. O cenário musical e a mídia da década de 80 começavam a esboçar um formato ainda atual, calcado no culto à celebridade e a sede de lucro sobrepujando a música em si. Figuras como John Lennon tentavam se reinventar nessa insípida realidade de uma geração yuppie, para quem as utopias dos hippies não diziam muita coisa. Contudo, se Lennon disse uma vez que o sonho havia acabado, Mark Chapman tratou de enterrá-lo de vez.



Três anos após a tragédia que entristeceu o planeta, eis que surge um Lennon filhote: jovem como o pai na época dos Beatles, e talentoso na medida certa. Seu visual e voz transfiguravam o pai com uma perfeição assustadora. Isso já bastaria para jogar sobre os ombros de Julian (lembram da letra de Hey Jude? “don’t carry the world upon your shoulders”) uma pressão imensa (veja aqui o primeiro single de sucesso de Julian, Too Late for Goodbyes).



E além disso, ele ainda por cima foi o primeiro baby beatle a ter um trabalho artístico divulgado em maior escala. O resultado não podia ser diferente: foi atacado por todos os flancos. Ainda que Paul e George mostrassem um público apoio em defesa à Julian, o pobre rapaz não foi poupado. O resultado pode ser notado na mediocridade de seus discos subseqüentes, como The Secret Value of Daydreaming (1986) e Mr. Jordan (1989), que provavelmente são frutos de uma queda livre emocional embalada pelo alcoolismo.


Julian só mostrou sinais de vida inteligente ao lançar, em 1991, Help Yourself, com produção de Bob Ezrin (que produziu discos como The Wall, do Pink Floyd). É um disco com bons momentos, e pelo menos uma grande música, o hit Saltwater.



Mas a boa forma só surgiria sete anos depois, no disco Photograph Smile (1998). É um grande disco, pelo menos na minha opinião. Tem pegada, boas composições, e é mais despojado que seu grandiloquente álbum anterior (Veja aqui uma faixa ao vivo, I Don’t Wanna Know) . Me lembra muito algumas musicas dos Tears for Fears na fase pós-Elemental, ainda mais pelo som das guitarras. Vale lembrar que Roland Orzabal (líder dos TFF) e Julian são grandes amigos. (veja aqui Julian tocando Stand By Me com Orzabal)

Parece que Julian lançou um EP agora em 2010, chamado Lucy, com quatro músicas inéditas. Também encontrei menções à um disco que já estaria pronto mas que não foi lançado ainda, chamado Everything Changes.


Sean Lennon



Sean Ono Lennon, diferente de Julian, sempre teve uma boa relação com a imprensa. Sempre foi incensado, e considerado um sujeito “antenado” com artistas de vanguarda (assim como a mãe, Yoko). Enquanto Julian viu John poucas vezes em toda a sua vida, – se tornando quase obcecado por ele (veja essa chocante entrevista, onde Julian, sem saber que é filmado, detona e exalta o próprio pai) – Sean viveu com o pai até seus cinco anos, e presenciou seu assassinato em frente ao edifício Dakota, naquele fatídico dezembro de 1980.



A ligação entre Sean e John é mais intensa do que parece: depois do casal Lennon passar por crises de abstinência em heroína e por tentativas frustradas de ter filhos (Yoko abortou várias vezes), além de tentativas do governo Reagan de extraditá-los dos Estados Unidos, eis que Sean nasce. Saudável, na época em que o visto da família é renovado, e o melhor: e no mesmo dia do nascimento de John.



Além de seus álbuns solo, Sean já tocou com muita gente boa. A “mamãe” Yoko foi a primeira, seguida de gente como Burt Bacharach, Medeski Martin & Wood, Lenny Kravitz, e até com os brasileiros Vinicius Cantuária, Tom Zé e os Mutantes.


Particularmente, eu achava ele um chato, metido a vanguardista e agitador cultural. Vislumbrei uma luz no fim do túnel quando tive contato com suas ilustrações (que podem ser conferidas em seu site oficial), e depois calei-me ao ouvir seu lançamento mais recente, Friendly Fire, de 2006.



A tristeza do término de um namoro parece ter feito o moleque se revelar: compôs as músicas, tocou todos os instrumentos, e até desenhou a capa do disco. Tudo de forma impecável. Aguardo ansiosamente seus próximos trabalhos.



Ah, vale lembrar que há alguns anos, Sean e Julian voltaram a se falar, depois de anos brigados.



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Em breve, a parte 2, onde falarei de Zak Starkey, James e Stella McCartney, e Dhani Harrison.

Resenha – The Blue Nile

Esses dias, descobri uma banda chamada The Blue Nile por um motivo quase trivial: lendo uma matéria dos discos prediletos dos integrantes do Marillion (uma banda da qual gosto cada vez mais, e em breve escreverei sobre isso no blog), percebi que dentre dez discos citados pelo vocalista Steve Hogarth, dois são do BN.




Minha curiosidade ia aumentando na medida em que percebia a escassez de informações sobre a banda na internet. Alguns sites definiam seu som como soturno ou melancólico, outros como introspectivo e minimalista. Mas o que chama a atenção é o fato de, num período de mais de vinte anos, eles terem lançado apenas quatro discos.


Por fim, ainda que não fosse tão bom e genial quanto o que algumas resenhas afirmavam, pelo menos eu fiquei instigado o suficiente para ouvir e tirar minhas próprias conclusões.







Feito isso, confesso que o som me agradou bastante. Me lembrou as canções mais intimistas de alguns discos que já ouvi muito no passado, como Both Sides, do Phil Collins (um de seus discos menos xaropes e mais introspectivos), ou algumas baladas dos anos 80 e da era do tecnopop.



A voz de Paul Buchanan me lembra tanto alguns momentos do Paul Carrack (artista pop e vocalista da banda Mike and the Mechanics) quanto o timbre do Brendan Perry (o vocal masculino do Dead Can Dance). As semelhanças, no entanto, não são depreciativas; muito pelo contrário. Os vocais emocionados de Buchanan é um dos pontos altos do Blue Nile.





Uma boa resenha que achei no site Whiplash comparava o álbum Hats, de 1989, à algumas coisas novas do Marillion. Alguns ecos podem ser mesmo notados, mas eu acho que os discos antigos do Blue Nile estão mais próximos de coisas do pop de sintetizadores típico da década de 80. Mas não pense nos sons datados de churrascaria: a obra desses escoceses resume o lado de maior bom gosto do universo oitentista. Em suma, estaria mais para um Vangelis do que para uma Bonnie Tyler ou uma Cyndi Lauper, por exemplo.



Dos quatro discos deles, até agora gostei mais do High, que além de ser o mais introspectivo, me lembra algumas coisas de lounge que eu gosto. Um dos singles do disco, Soul Boy, é um típico tema lounge do mais alto calibre. Fora que esse disco tem um equilíbrio maior entre cordas e sintetizadores que os outros.



A banda continua na ativa, com apenas dois dos três membros originais, Paul Buchanan (vocal e guitarra) e Robert Bell (baixo e teclados). Na lista de colaborações dos caras, se contabilizam nomes como Julian Lennon (em breve, escreverei um texto sobre os “baby beatles”), Maire Brennan (do Clannad, irmã de Enya), Rickie Lee Jones (a Joni Mitchell dos anos 80. Mas e a Suzanne Vega? Essa estaria mais para um Leonard Cohen de saias!), Annie Lennox (Eurythmics), Peter Gabriel, e até com Mel C. (ex-Spice Girls).



Uma curiosidade: o primeiro disco do Blue Nile, A Walk Across the Rooftops, é o no 521 na lista dos 1001 Discos Para Se Ouvir Antes de Morrer, de Robert Dimery.